Familiares dizem que rapaz ficou na observação três dias
Reportagem de Dilson Ornelas

A família do professor Igor Thales Rocha e a polícia civil tem feito de tudo para manter a imprensa longe do assunto, mas a Reportagem de Voz do Acre descobriu que longe de jornalistas e de curiosos, o corpo do professor Igor Rocha foi exumado por volta das 10 horas da manhã de sábado. Uma investigação tenta apurar porque ele morreu no Hospital Regional do Juruá no dia 29 de janeiro, depois de ficar três dias agonizando em observação.
A polícia procura indícios que incriminem o Hospital Regional do Juruá, ou alguns de seus médicos, por possível negligência no atendimento ao paciente, que teria falecido na sala de cirurgia cerca de 52 horas após dar entrada no Pronto Socorro.
O delegado Elton Futigami investiga a possibilidade de negligência, hipótese levantada pela família de Igor, que registrou um Boletim de Ocorrência na Delegacia Geral de Cruzeiro do Sul. A história de sua morte é dramática. Familiares dizem que o jovem de 23 anos morreu por circunstâncias ainda não esclarecidas, sem receber atendimento adequado.

Sábado os peritos recolheram para análise fragmentos do fígado e de outras partes do corpo de Igor, mas os intestinos haviam sido retirados no hospital. Além do delegado e do perito estavam na exumação a irmã de Igor, Romara dos Santos Rocha e sua prima Ana Paula Fernandes.
Pela certidão de óbito, Igor morreu dia 29 de janeiro por causa de uma doença conhecida como Trombose mesentérica, que provocou um infarto intestinal, por volta das 17 horas. Mas a sua irmã Romara disse que ele morreu bem antes, às 15 horas. Pela apuração de nossa Reportagem, o médico que estava de plantão, disse que nesse momento (às 15 horas) ele não morreu, teve na verdade uma parada cardíaca, mas foi reanimado e encaminhado para a cirurgia.
A imprensa não tem acesso ao Boletim de Ocorrência porque o caso é mantido em sigilo pela polícia, por isso não se sabe exatamente qual o foco da investigação. Porém, adiantamos que todos os médicos que atenderam o paciente estão passíveis de ser investigados. Os nomes de médicos aqui mencionados foram citados durante entrevista com alguns familiares, não foram fornecidos pela polícia.
A Reportagem de Voz do Acre conversou com o cirurgião Marlon Holanda, que iniciou o plantão na manhã de terça-feira em que Igor faleceu. O médico que estava saindo pediu que ele fizesse uma avaliação no paciente, que sentia muita dor.
É difícil afirmar que o doutor Marlon Holanda teria agido com negligência, já que em seu plantão ele identificou a necessidade de cirurgia e cumpriu os procedimentos necessáriosao caso, segundo nos contou.
Transplante de intestino

“Eu solicitei exames e percebi que os resultados indicavam que o caso dele era de cirurgia. Era um caso muito grave, tanto que teve duas paradas cardíacas.
“O que eu posso dizer é que quando abrimos seu abdômen vimos que todo seu intestino estava necrosado, não havia muito o que fazer para mantê-lo vivo. Mesmo assim eu e a equipe que trabalhou comigo, fizemos tudo que podíamos para salvar o paciente. Tentamos colocar uma bolsa, mas sabíamos que a única coisa que poderia salvá-lo seria um transplante de intestino. E esse não é um procedimento comum no Brasil”, disse o médico.
O médico disse que o caso era tão grave que mesmo que ele tivesse sido operado domingo, quando chegou ao hospital, as chances de sobreviver eram quase nenhuma. Quanto à hipótese de que Igor tivesse morrido de apendicite, o médico disse que a apêndice do paciente não tinha qualquer sinal de inflamação.
“Só estou triste porque a família poderia ter me procurado e eu teria esclarecido tudo nos mínimos detalhes. Ele era meu amigo, eu já havia operado ele de uma embolia pulmonar, e pode ter certeza que eu fiz de tudo para manter ele vivo”, disse Holanda, um cruzeirense que estudou Medicina em Manaus e exerce a profissão há quatro anos.
Felicidade e agonia
Dione dos Santos Rocha, tia de Igor, conta que ele estava feliz com a aprovação em um concurso público e foi comemorar com um amigo na noite de sábado, dia 2 de fevereiro. Tomaram algumas cervejas e comeram um churrasco.
Na manhã de domingo, no entanto, ele foi acometido por uma forte dor abdominal. No hospital de Rodrigues Alves, o médico conhecido pelo nome de James disse, segundo Dione, que Igor não tinha nada. As dores seriam por causa da bebida. Mas como as dores não cessavam, Igor foi levado então para o Hospital Regional do Juruá na manhã do mesmo dia.
De acordo com a irmã do paciente, no Hospital Regional o médico Júlio César confirmou o diagnóstico de embriaguês, e passou alguns remédios. Comentou que não era nada sério.
No restante do domingo e na segunda, quando a embriaguês estaria automaticamente descartada, o quadro clínico piorou. Igor continuava sentindo muita dor ao lado da barriga. Passou a vomitar sangue e o sangue passou a sair também em suas fezes. Nesse período Igor foi medicado com morfina, tramal, dipirona e dexametasona.
Primeira parada cardíaca
No início da tarde de terça-feira, segundo Romara, pouco antes de morrer o irmão foi ficando com uma cor arroxeada e se queixou de que a perna estava dormente. O médico espetou uma agulha em sua perna e ele não sentia mais nada.
Ele parecia saber que alguma coisa estava errada e suplicava por uma cirurgia. Igor se queixou de falta de ar e Romara saiu gritando apavorada pelo corredor. Colocaram o oxigênio em Igor e saíram de perto do leito. O rapaz então disse à irmã que o ar não estava funcionando. Suspirou fundo, e sua cabeça pendeu para o lado.
A irmã de Igor conta que nesse momento, embora estivesse angustiada, viu as enfermeiras colocarem um aparelho para medir os sinais vitais do professor, e não havia mais nenhum sinal de vida. “Uma balançava a cabeça negativamente para a outra”, conta Romara. Mas mesmo assim ele foi levado para outra sala.
Situação era muito grave, segundo o médico
Por volta das 17:30 ela conta que conversou com o médico Marlon Holanda, que disse que o rapaz havia tido duas paradas cardíacas, mas que já estava reanimado. Falou que o problema de Igor era muito mais grave do que se imaginava e que se sobrevivesse teria sequelas para o resto da vida. Teria que ser alimentado pela veia.
“Mas ele vai ficar bom?”, teria indagado a irmã. “É o que estou lhe dizendo, se ficar será alimentado pela veia”, teria respondido o médico.
Igor já estava morto
Dione da Rocha, tia de Romara e de Igor, trabalha há mais de 20 anos na área de saúde, e garante que às 17:30 quando o médico disse que o rapaz estava vivo, na verdade seu sobrinho já estava morto.
“Eu cheguei lá por volta das 4 horas da tarde e insisti para falar com ele, e ele contou que Igor havia tido duas paradas cardíacas e que foi reanimado, mas que só sobreviveria por um milagre”.
Dione perguntou qual era o problema do paciente e o médico disse que a doença era conhecida como um infarto intestinal, que causa um entupimento de uma artéria seguida de necrose (morte celular) do intestino.
Veja a seguir simulação do diálogo entre Dione e Holanda, segundo a versão contada por ela:
- Necrosou um pouquinho assim (mostrando com a mão uma medida aproximada de dez centímetros)? – quis saber a tia do paciente.
- Não, foi muito.
- Muito quanto?
- Uns 8 metros. Disse o médico.
- Então o senhor tirou o intestino grosso e o delgado.
- Foi.
- Então, doutor, meu sobrinho está morto.
- Realmente está. Ele não resistiu à cirurgia.
Saiba mais sobre Trombose mesentérica
Pesquisa em site da Associação Brasileira de Hematologia mostra que a Trombose Mesentérica é uma doença rara. Entre os principais sintomas está a dor abdominal muito forte. Ocorre geralmente em jovens e é conhecida como infarto intestinal.
A taxa de mortalidade por paciente varia entre 20% e 50%, a sobrevivência depende de vários fatores, como idade, presença ou ausência de comobilidades e o tempo entre o diagnostico e a intervenção da cirurgia.
A dor súbita de intensidade variável no abdome obriga a vitima a procurar socorro médico, na maioria dos casos é uma condição de urgência que requer diagnostico rápido e específico. O tratamento geralmente envolve cirurgia.
A doença provoca septicemia, infecção generalizada grave, causada por micro-organismos patogênicos, como vírus, bactérias e fungos que se espalham pela corrente sanguínea se reproduzindo com muita rapidez.
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