10 de mai. de 2021

Não nascem mais mães

 



Brisa fresquinha extraída da fonte natural

Casinha de paxiúba, cobertura de palha

Cama improvisada para três, outra pra dois

Rede para um no canto da cozinha

As intimidades rolavam no silencio sem direito a gemidos

A voz ecoando no silencio saindo do quarto era dela,

O almoço servido simbolizava o clímax de um ritual que iniciava com o cantar do galo.

Passos sorrateiros para não incomodar os pequenos que dormiam,

Lenha sequinha, vaso no barro manualmente moldado,

Um, dois sopros a fumava dava lugar a chamas vivas

Uma colher semeava na água o doce para mais tarde o preto ter sabor.

Num ritmo sincronizado os copos se enchiam

Uma panela de cintura negra com sobras

Colheres entravam vazias, saiam branquinhas

E assim seguiam molhadas com o inesquecível liquido negro

Não havia dialogo frasal, falar era fatal para perder a vez

Todos já entendiam e sabiam que dali tarefas existiam

Cadernos para que vai ser letrado

Terçado para quem vai buscar o sustento

Louça lavada com areia e sabão caseiro

Espelho capaz de ver até a menor das sarnas

Madeira no fogo, panela maior

Grãos na mão, choro na rede, roupas sujas a esperar

Tampa a paneja, atiça com vontade as chamas

Guri no colo, mãos ágius a varrer, água a jogar e guri a mamar

Cria na rede, cassete na roupa, olho no fogo

Pote nas costas, prepara cavacos, estende os trapos

Sal no peixe, peixe no óleo, pingos fumegantes na mão

Escapa um palavrão, choros na rede, mãos a embalar

Aos poucos a casa começa a se movimentar

O barulho de quem vem da escola é fácil a identificar

Mãe já sei soletrar, mentira mãe ela não sabe nem fazer um “A”

Para de quizomba menina sua irmã vai acordar

Mesa no chão, panela de feijão

Fartura da semana

Olhar satisfeito de quem cumpriu de direito seu dever.

Só para não esquecer a tarefa de até então só rodou o ponteiro do sol até o oitão

Muita coisa até o escurecer aquele ser vai precisar fazer

A criança volta a chorar

Tal qual raio um peito já tá a mamar

Chefe senhor começa a reclamar

Ninguém na casa para lhe ajudar

Aqui vou morrer de trabalhar

Senhor a esposa que ganhei nada sabe fazer.

Os anos correm

A saga também

Mulheres se empoderam

Profissionais diversas

Mas cá de longe o matuto velho pensa e joga ao vento

As palavras caem na tela e aqui eu digo:

Não nascem mais mães, apenas mulheres


Uma singela homenagem do Blog Amigo das Letras para as mães raízes

 

 

 

 

 

 

 

3 comentários:

  1. Excelente texto professor. Lembrei de quando mora no Riozinho Cruzeiro do Vale, quantas lembranças me reacendeu 😢só saudades

    ResponderExcluir
  2. Muito bom.
    Quem vive no interior (zona rural).sabe bem que está escrito.

    ResponderExcluir
  3. A doce e penosa vida na roça. Sei bem o que é isso, e apesar das dificuldades éramos felizes e não sabíamos...kkkk

    ResponderExcluir

10 de mai. de 2021

Não nascem mais mães

 



Brisa fresquinha extraída da fonte natural

Casinha de paxiúba, cobertura de palha

Cama improvisada para três, outra pra dois

Rede para um no canto da cozinha

As intimidades rolavam no silencio sem direito a gemidos

A voz ecoando no silencio saindo do quarto era dela,

O almoço servido simbolizava o clímax de um ritual que iniciava com o cantar do galo.

Passos sorrateiros para não incomodar os pequenos que dormiam,

Lenha sequinha, vaso no barro manualmente moldado,

Um, dois sopros a fumava dava lugar a chamas vivas

Uma colher semeava na água o doce para mais tarde o preto ter sabor.

Num ritmo sincronizado os copos se enchiam

Uma panela de cintura negra com sobras

Colheres entravam vazias, saiam branquinhas

E assim seguiam molhadas com o inesquecível liquido negro

Não havia dialogo frasal, falar era fatal para perder a vez

Todos já entendiam e sabiam que dali tarefas existiam

Cadernos para que vai ser letrado

Terçado para quem vai buscar o sustento

Louça lavada com areia e sabão caseiro

Espelho capaz de ver até a menor das sarnas

Madeira no fogo, panela maior

Grãos na mão, choro na rede, roupas sujas a esperar

Tampa a paneja, atiça com vontade as chamas

Guri no colo, mãos ágius a varrer, água a jogar e guri a mamar

Cria na rede, cassete na roupa, olho no fogo

Pote nas costas, prepara cavacos, estende os trapos

Sal no peixe, peixe no óleo, pingos fumegantes na mão

Escapa um palavrão, choros na rede, mãos a embalar

Aos poucos a casa começa a se movimentar

O barulho de quem vem da escola é fácil a identificar

Mãe já sei soletrar, mentira mãe ela não sabe nem fazer um “A”

Para de quizomba menina sua irmã vai acordar

Mesa no chão, panela de feijão

Fartura da semana

Olhar satisfeito de quem cumpriu de direito seu dever.

Só para não esquecer a tarefa de até então só rodou o ponteiro do sol até o oitão

Muita coisa até o escurecer aquele ser vai precisar fazer

A criança volta a chorar

Tal qual raio um peito já tá a mamar

Chefe senhor começa a reclamar

Ninguém na casa para lhe ajudar

Aqui vou morrer de trabalhar

Senhor a esposa que ganhei nada sabe fazer.

Os anos correm

A saga também

Mulheres se empoderam

Profissionais diversas

Mas cá de longe o matuto velho pensa e joga ao vento

As palavras caem na tela e aqui eu digo:

Não nascem mais mães, apenas mulheres


Uma singela homenagem do Blog Amigo das Letras para as mães raízes

 

 

 

 

 

 

 

3 comentários:

  1. Excelente texto professor. Lembrei de quando mora no Riozinho Cruzeiro do Vale, quantas lembranças me reacendeu 😢só saudades

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  2. Muito bom.
    Quem vive no interior (zona rural).sabe bem que está escrito.

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  3. A doce e penosa vida na roça. Sei bem o que é isso, e apesar das dificuldades éramos felizes e não sabíamos...kkkk

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